Saber o que multiplicar


A vida multiplica em nós o que lhe entregamos - multiplica o que lhe oferecemos com nossas próprias mãos. Nada pode ser multiplicado, senão o que escolhemos dar de nós aos outros, sem mesquinhez.

Alguns multiplicam realidades obscurecidas pela evocação do que não agrega, que dispersa, que enfraquece. Escondem, paradoxalmente dentro de si, o que reluz, quando sorriem às multidões, mas mostram-se apagados e sem de luminosidade ao se afunilarem em relações mais próximas.

É ali onde se notam os excessos de escuridão de seus porões secretos, que sem muitos esforços afastam para longe a quem se aproximou, iludido de encontrar mais luz por detrás do sorriso. Não porque que estejam desprovidos de luz, mas porque fizeram da luz algo superficial, que só se acende em eventos de conveniência, mas se apaga facilmente na hora dura de pegar a própria existência nas mãos,  de encarregar-se de si mesmos.

Outros aprenderam que para não deixar o mundo desprovido de luz é preciso multiplicar o bom algouro, estreitar laços, aproximar pessoas, bendizer, em lugar de maldizer, dar aos outros aquela sensação sincera e verdadeira de que por mais que existam os atalhos com pontos de escuridão e é inevitável encontrar-se com eles, contudo e em tudo, brilha imperiosa a luz que se acendeu desde o início de nossa existência.

Há gente que ilumina só com o olhar, que esparrama luz por onde anda e invade a vida com sua luz própria; que se esforça para dar o seu melhor. Pessoas assim  entendem que a vida não é feita de facilidades e favores, mas de luta constante por alcançar a própria excelência e ser excelente para os outros. Não há facilidade que sustente luz própria; é preciso segurar com responsabilidade e alguns sacrifícios a própria lâmpada acesa.

“Somos o que fazemos, mas somos principalmente o que fazemos para mudar o que somos”, disse Galeano.
A vida é uma rocha bruta que precisa ser lapidada, uma peça que nós mesmos manuseamos e da qual podemos aparar arestas, transformando as saliências desnecessárias em superfícies mais suavizadas que não firam ou representem riscos. Quem assim compreende a dinâmica do existir exerce a sabedoria de multiplicar o bom, o belo, o luminoso.

Multiplicar luz ou escuridão é uma escolha da própria consciência, do modo como queremos nos projetar e de como nos relacionamos com estes dois potenciais que habitam dentro de nós. Temos luz em potencial, temos escuridão em potencial.

A vida multiplica em nós o que lhe entregamos - multiplica o que lhe oferecemos com nossas próprias mãos. Nada em nós pode ser multiplicado, senão o que escolhemos dar de nós aos outros, sem mesquinhez.


Ir. Janete Silva,CIC

Comentários

  1. Lindo texto!
    Que possamos multiplicar atitudes e gestos de paz, ternura, gratidão, amor, otimismo, tolerância, escuta...
    Que a criança que existe em nós seja sempre contemplada com momentos como desta imagem, o brincar de forma espontânea!
    Como diz Maria Amélia Pereira, em Tarja Branca: "Brincar é usar o fio inteiro de cada ser!"

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  2. Obrigada, Bel Calleja! Multipliquemos o belo!

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