Se eu errar a estrada, mostre-me o caminho de volta.
Tem dias na vida que a
consciência arrebata a alma e ela luta contra uma nuvem cinzenta que cobre o
horizonte, impedindo-me de ver claramente o que há pela frente. Nestas horas é
que me dou conta de que simplesmente errei de estrada e tomei rumos que não estavam
em meu mapa de trilha.
Viver é descobrir a vida pouco a
pouco, fazer e refazer, escolher e rever escolhas; um constante despojamento de
certezas e convicções, um forçar inerente ao aprendizado, um mergulhar
profundamente na dolorosa e fascinante aventura do existir.
Algumas vezes eu me perco dentro
deste mistério e experimento no paladar o gosto amargo de certas coisas que não
gostaria de provar; no entanto, o que seria de mim se apenas degustasse o que
me dá prazer e sensação de bem-estar?
Ao longo da vida desenhei mapas,
mas pela força da existência tive que redesenhá-los e seguir novos rumos ou
reassumir, de outra maneira, o trajeto de estradas que eu havia abandonado, e
por tal atitude, traído meu projeto de vida.
Nos assombros das tardes
tenebrosas de minha solidão de caminhante, recobrei a memória de quem eu sou e na
escuridão experimentei a luz que não encontrei fora, mas que eu mesma havia
sufocado dentro de mim. Experimentei o caos, mas não menos a recriação.
Enquanto escrevo, minha memória
afetiva volta aos lugares pelos quais já passei. Ouço risos, sinto toques, ouço
choro, sinto as lágrimas quentes que escorrem pelo rosto, entrego-me aos abraços, afagos, ouço palavras belas e menos
belas, vou me misturando na tessitura da vida que experimenta um caminhante. Nesses lugares, ergui altares como sinal de gratidão e os registrei no santuário interior, para que se tornassem ícones de eternidade.
Muitas vezes errei de estrada e
tive que recomeçar a caminhada, remarcando com estacas os lugares errados por
onde passei. Poderia não marcá-los, para apagá-los da memória e borrá-los do
mapa; mas, se não o fizesse, desconsideraria que por mais que se configurassem
erros, foram oportunidades de remissão comigo mesma e desta forma não
imputaria sobre este ser criado para ser luz, a culpa da treva. Sim os erros
podem ser pontes para acertos.
Foi assim que aprendi a fazer uma
prece cotidiana, a cada amanhecer e a cada pôr do sol, com minha alma arrebatada
pela consciência: se eu errar de estrada, mostre-me o caminho de volta.
Ir. Janete Silva-CIC
Comentários
Postar um comentário